Ano 12 Nº 072/2024 – A CORAJOSA SARA SANCHEZ CASTANEDA
Por Sara Sanchez Castaneda
“Olha, eu estou te escrevendo só pra dizer que se você tivesse telefonado hoje eu ia dizer tanta, mas tanta coisa. Talvez mesmo conseguisse dizer tudo aquilo que escondo desde o começo, um pouco por timidez, por vergonha, por falta de oportunidade, mas principalmente porque todos me dizem que sou demais precipitado, que coloco em palavras todo o meu processo mental (processo mental: é exatamente assim que eles dizem, e eu acho engraçado) é que isso assusta as pessoas, e que é preciso disfarçar, jogar, esconder, mentir”. Caio Fernando de Abreu.
Enquanto me embarco nas águas da escrita acadêmica, às vezes, esqueço minha identidade em relação aos textos que produzo. Em algum ponto da minha formação, comecei a desenvolver minha autoria com a objetividade e a exatidão como seus valores fundamentais. Em algum ponto negligenciei a minha voz. Durante muito tempo, me esforcei por construir um tom neutro e conciso, evitando qualquer manifestação da minha personalidade (claramente, ainda dá para perceber). Eu sempre achei aquilo irrelevante, até impróprio. No entanto, através dos trabalhos do curso, consegui romper com minha rigidez auto-imposta. Na minha prisão mental, os presos começaram a planejar sua fuga.
Começou com a leitura de Caio Fernando Abreu, o jornalista que, com coragem, dedicou seus últimos anos a escrever sobre suas vivências como homem homossexual. O que realmente me cativou foi a intensa luz da sua honestidade, que acabou por revelar a falta da minha. Na verdade, tinha tanto medo de me expor através da minha escrita, que optei por me suprimir por completo. Tinha me enterrado viva.
Outra verdade: este texto é uma das minhas primeiras tentativas de romper com esse padrão. Pensei em não enviá-lo, pensei muito, mas decidi mudar minha postura em relação à escrita e comecei a redigir pequenos ensaios diariamente. Mesmo que sejam textos imperfeitos, sei que ainda tenho muitas décadas pela frente. Cinquenta, sessenta, setenta anos. Falhas, experiências, lições. É apenas o começo, o prelúdio. O barulho da vida cotidiana está sendo gradualmente substituído por frases e palavras, na busca incessante pela frase perfeita para este preciso momento. Desenvolvi uma nova sensibilidade, sou uma criança sentindo seu dente crescer, o primeiro botão de uma flor.
Acredito que o medo sempre fará parte de mim, mas estou aprendendo a coexistir com ele. Sinto-me entusiasmada com a possibilidade de integrar esses novos olhares no meu trabalho acadêmico. Talvez um dia tenha a coragem de me aventurar na escrita criativa.
Texto introdutório do dossiê: O CORAÇÃO CIENTÍFICO
Sara Sanchez Castaneda é uma estudante internacional da Guatemala fazendo o curso de ciências sociais na UFF. Tenho 20 anos e meu coração transborda de amor pelas artes, incluindo recentemente a escrita. Acredito que tudo que você precisa saber sobre uma pessoa depende de seus autores favoritos, os meus são a Simone de Beauvoir e o David Graeber.