Ano 06 nº 001/2018 – O MACRO, O MICRO E O MICO – SOBRE GENERALIZAÇÕES, BOATARIAS E A CULTURA DA MENTIRA
Por: Matheus R. Santos
Vivemos tempos confusos em todos os âmbitos de nossa sociedade. Observamos a todo o momento as mais variadas manifestações preconceituosas, linchamentos virtuais, crimes hediondos, enfim, amostras de tudo que há de ruim. De fato, a vida e a modernidade – definida como líquida por Bauman – sem dúvida alguma, tem tendido a nos mostrar a pior de suas faces nas últimas ocasiões. Todavia, para o senso comum, um somente é o problema causador de tudo isso: a Política, ou melhor, os Políticos que praticam esta política.
Fugindo dos clichês e fazendo uma breve análise histórica de tal palavra, constataremos que etimologicamente falando, a palavra “Política” vem do grego POLITIKOS, que significa algo que é relativo ao cidadão e/ou Estado. Logo, cabe nos seguintes parágrafos deste texto, uma breve abordagem sobre o peso que a etimologia desta palavra traz para nós, seres, acreditem ou não, políticos.
Se por um lado, o presente texto não tem como intuito negar a sabida e mal intencionada manipulação sofrida por nossa população por parte dos aparelhos repressivos e também ideológicos do Estado – abordados na teoria de Althusser –, por outro, ele tem seu foco, especialmente, no que diz respeito ao íntimo próprio de cada ser humano, abordando suas incoerências, junto de um de seus piores demônios, a falta de autocrítica.
Em tempos poucos cordiais – e de certo desespero – como este, tende-se a elevar tudo a um nível extremo de maneira a fazer com que relações sejam rachadas e que a confiança se esvaia. Entretanto, há de se convir que antes de cobrarmos tão frigidamente, neste caso, nossos políticos, precisamos olhar internamente para nós mesmos.
A autocrítica é um caminho complicado e repleto de opacidade, pois ainda que tenhamos a ideia de um distanciamento maior das situações, continuaremos a observar tudo o que se passa a nossa volta sob uma única perspectiva: a de nós mesmo.
Ainda assim, negá-la é um grande erro, ou melhor, é a própria incoerência. Tendemos a cobrar de nossos representantes no congresso atitudes transparentes, um caráter invejável e uma ética a qual teríamos que voltar mais uma vez para o sentido etimológico das palavras, para entendê-la por completo. Porém, se pensarmos um minuto além de nosso próprio “quadrado”, perceberemos que todas as atitudes feitas por nós em nível micro, possuem suas versões quando pensamos no macro.
Reflita comigo: quantas vezes você, suposto cidadão de bem, já ficou com o troco errado – para mais, evidentemente – que a atendente do supermercado lhe deu? Ou melhor, quantas vezes você, cidadã de bem, tentou subornar o guardinha de transito para ele lhe dar mais “quinze minutinhos” no estacionamento a fim de que não fosse multada?
Caros amigos, me desculpem. Mas sinto informar que tais atitudes tomadas por vocês, estão mais próximas do que se pensa do fato de Geddel roubar milhões de reais e alocá-los dentro de um apartamento, ou do golpista Michel Temer comprar votos no congresso para que a sua permanência na presidência do país não seja sequer questionada.
Cobrar de alguém algo que você não faz, não é só própria incoerência, mas também indica um enorme desvio de caráter, afinal, quando é o cristão, de extrema direita que mente descaradamente em seus discursos, somos os primeiros a criticar e evidenciar isso.
Este fato já referido, obviamente, não acontece como um recorte, de forma sozinha, mas sim junto de um apanhado de problemáticas que a acompanham.
Meses atrás, após um boato, viu-se o linchamento virtual de uma menina por um suposto aborto premeditado, proferiram contra ela e seu namorado todos os piores xingamentos e ameaças. Algum tempo depois, ficou provado que o referido ocorrido havia se dado de forma espontânea, porém, mesmo existindo um laudo comprobatório de uma versão totalmente diferente a que se acreditava, ou melhor, da que foi INVENTADA e amplamente comentada, nem um pedido de desculpas sequer viu-se direcionado nas redes para tal casal – e em especial, para a jovem moça –.
Pensem comigo então, será que alguém lembra, ou melhor, dá a mínima para o caso agora? Eu aposto que sim, a menina, julgada erroneamente por muitas pessoas que, acreditando em um boato, acabaram por quase destruir sua vida.
Dessa maneira, pode-se constatar que todos seguem em frente, independente do grau de proximidade destes que sofrem com tais problemas. Só não seguem aqueles que sofrem com a liquidez dos tempos modernos, onde hoje se está junto e já amanhã não olha-se na cara de uma pessoa que em outrora fora próxima.
Pautar qualquer convicção em boatarias é errôneo, não se pode pôr em cheque a índole de alguém por mentiras transpassadas por outras pessoas. Querer, nunca vai ser poder, todavia, poder é querer ser diferente e não errar onde outros já erraram.
A mentira não pode continuar sendo relativizada, seja lá qual o for o meio em que ela esteja sendo proferida. As pessoas devem ser responsáveis por suas palavras – e por aquilo que inventam –, pois caso contrário, meu ético amigo, continuaremos perpetuando uma cultura antiética e mentirosa. Pautada no achismo e na irresponsabilidade para com o outro que normalmente sofre das invenções que surgem do acaso.
Dias atrás deparei-me com Doctor Rey, figurão oportunista, que é pré-candidato a presidência de 2018, afirmando em rede nacional que o grande problema do país eram os comunistas em conjunto dos socialistas, pois estes prezavam a igualdade social por baixo, na pobreza. Uma falácia, óbvio, vinda de um homem, dito brasileiro, que sequer morou aqui direito, porém, que começa parecer verdade a partir do momento em que muitas pessoas começam a repeti-la.
Não importa se a relação é micro ou macro, a grande questão aqui é a nossa repulsa aos pensamentos generalizadores da cultura da mentira, afinal, ela, no fim, é, de fato, um grande erro.
Todos, sem exceções, possuímos qualidades e defeitos. Ainda que, aparentemente, neste atual mundo em que vivemos o qual tanto nos cobra, gera competição e dissemina ódio gratuito, o ser humano tenda a sempre demonizar o outro a fim de conseguir sentir-se mais próximos dos anjos. Afinal, é muito mais fácil eu procurar inventar boatos e ofender um alguém, do que olhar para eu mesmo e tentar melhorar naquilo que venho falhando costumeiramente, não é mesmo?
Por conseguinte, é necessário trazer aquela célebre – e extremamente clichê – frase, que diz: quem bate, logo esquece, porém, quem apanha, lembra, pois as cicatrizes tendem a doer por muito tempo ainda.
Necessitamos ter a ciência de que ao falarmos algo que não temos certeza, afetaremos outras pessoas. Nossas relações são instáveis, fazendo com que mentiras se perpetuem enquanto verdade por ai.
Por fim, para não me alongar ainda mais naquilo que deveria ser apenas uma breve reflexão, afirmo, meu caro amigo tão ético:
É-se a própria farsa, seja numa relação micro ou macro, tua incoerência é o teu próprio mico.