Ano 11 Nº 080/2023 – Juntos e juntas, todos ganhamos!

Por Roselaine Moraes de Moraes Barcellos

Ao longo de quase vinte anos como docente na Educação Infantil e nos Anos Iniciais, fui presenteada pelos alunos com diferentes manifestações de carinho, e assim, reunindo memórias afetivas muito importantes para a minha formação pessoal e profissional, porém, desta vez foi diferente.

Esta é uma história real, que aconteceu em uma turma do 5º ano do Ensino Fundamental, na cidade de Bagé/RS na qual sou regente de classe. Nossa turma estava em um dos momentos preferidos, que é a leitura do Plano Literário do bimestre. O livro em questão é “O Pequeno Príncipe Preto”, de Rodrigo França. Um conto que evidencia ancestralidade, empatia e afeto através das páginas e ilustrações, reforçando a ideia de que juntos e juntas, todos ganhamos.

A apreciação do livro ocorria de forma tranquila e prazerosa, quando em um determinado momento, uma aluna se dirigiu até mim e relatou a importância de estarem lendo-o, pois nunca tinha visto um livro infantil que trouxesse palavras relacionadas a sua religião (que é de matriz africana), tais como “erê” e “xangô”, e que tinha receio de falar sobre ela com os colegas por medo de sofrer alguma forma de preconceito religioso. Inclusive, ela sequer sabia se outros colegas também eram adeptos como ela.

Eu disse que cada religião tem sua importância, e que as pessoas escolhem aquelas que melhor se identificam. Ainda falei que são as nossas ações e atitudes diárias que mostram as pessoas que somos, e que devemos valorizar princípios como empatia, justiça, igualdade, entre outros. No decorrer da nossa breve conversa, que durou alguns minutos, quis saber um pouco mais sobre a sua religião, e o que ela poderia me ensinar, já que gosto de aprender sobre todas as manifestações para entendê-las. Enquanto isso, os demais continuavam fazendo suas leituras, alguns individualmente, outros em duplas ou em trios fazendo considerações que julgavam interessantes.

Nosso momento de leitura terminou com o relato de alguns discentes, onde uns falaram sobre o vocabulário trazido no texto, outros sobre as ilustrações, ou ainda, sobre sentimentos que identificaram.

No dia seguinte, como sempre, perguntei a eles como tinha sido a manhã e se estavam bem. Após a rotina da tarde iniciada, nossa aula acontecia deforma tranquila, quando a mesma aluna com a qual conversei sobre sua religião se levantou e dirigiu-se até mim. Ela trazia um pacotinho envolto por suas mãos, me olhou com um semblante alegre, cheio de ternura e disse:

— Te trouxe um presente! Tu queres?

Fiquei alegre, sorri para ela e respondi que sim, afinal, adoro quando sou lembrada por eles de alguma forma. Enquanto eu desenrolava a embalagem era possível sentir que aguardava ansiosa pela minha reação. Assim que vi o que era, prontamente ela me disse com entusiasmo:

— É uma guia!

Eu respondi que tinha gostado muito, mas que queria uma explicação sobre o sentido do presente. Tivemos mais alguns minutos de conversa, enquanto ela me explicava que serviria como uma proteção espiritual para mim, e que havia sido dada com muito carinho, porque muitas vezes ela não estava bem (como por exemplo, quando seu pai tirou a própria vida), e eu estava ali, recebendo-a com amor e doando minha energia positiva para ela.

A partir daquele momento eu reforcei a minha convicção de que não se trata apenas do ato de ministrar aulas. É muito além disso! É sobre conhecer vidas, histórias e aceitar as expressivas e afetivas aprendizagens que podemos ter com nossos alunos. Eles têm seus saberes, suas vivências e estão sedentos pela troca de experiências.

Ser presenteada com uma guia tendo um sentido tão especial, me deixou emocionada. Foi com certeza, uma das manifestações de afeto mais sinceras e genuínas que recebi ao longo da minha trajetória como professora. Uma atitude que em mim, reforça o compromisso com a educação e me faz cada vez mais feliz e realizada por ter a oportunidade de conhecer tantos jovens potentes, cheios de vida e amor para dar.

Assim, a premissa do “Pequeno Príncipe Preto” se cumpriu, pois de fato: juntos e juntas, todos ganhamos!

Roselaine Moraes de Moraes Barcellos é aluna do Mestrado Profissional em Ensino de Ciências (Unipampa/Bagé) e aluna da especialização em Psicopedagogia (UFSC). Especialista em Mídia e Educação, Alfabetização Matemática, Supervisão e Orientação Educacional; Graduação em Pedagogia; Curso Normal com habilitação para Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Funcionária pública municipal de Bagé desde 2010, onde atua como professora na EMEF Téo Vaz Obino e funcionária da rede de ensino particular desde 2006, onde atua no colégio Presidente Emílio Garrastazu Médici.

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