Ano 05 nº 097/2017 – Anarquismos, Pós-escolarização & Resistências: Conversações com Paulo Lisandro Amaral Marques

Entrevista a Lucas Rosa.

Apresentação

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Foto: Rita Maciazeki.

Falar da abolição da escola como um projeto ético, político e pedagógico que objetiva ampliar o acesso à educação – certamente, uma outra educação – pode parecer surpreendente para quem não acompanha um determinado debate entre grupos de intelectuais e ativistas que vem atravessando décadas. Estou me referindo evidentemente ao debate quem tem ganho diferentes títulos ao longo do tempo, tais como o da desescolarização e da pós-escolarização. Para o professor Paulo Marques, o pouco espaço que a discussão tem ocupado no campo da educação se dá, principalmente, porque a escola é um contexto de “disputa por poder no âmbito do Estado”. Segundo ele, no entanto, há um grupo que não aceita ser pautado pelas regras postas nessa disputa e tenta construir um espaço alternativo de ação – os anarquistas e libertários.

Na entrevista a seguir, Paulo – seu primeiro nome e como me dirigi a ele – discute, a partir de uma perspectiva anarquista, qual papel da educação, quais alternativas de espaços e momentos os grupos contra-hegemônicos vêm construindo e, fundamentalmente, os motivos que envolvem o silêncio dos educadores frente à crise da escola. Segundo ele, “já tem gente demais envolvida com a escola e poucos que pensam para além dela”, e é por isso que sua preocupação está em entender como outros espaços se auto-organizam e como se pode pensar em propostas que resistam à violência que reside no contexto escolar.

Nosso diálogo foi travado através de uma desapressada troca de e-mails, de forma que pude fazer minhas indagações sem que Paulo se sentisse pressionado em relação ao tempo. Mesmo distanciados por alguns quilômetros que separam os municípios de Pelotas e Bagé, nossa interlocução foi embalada por um interesse de ambos nas questões que estavam sendo enunciadas. Com algumas pausas, mas também com momentos de trocas de mensagens em uma velocidade admirável, foi se tecendo a conversa que se encontra nas páginas seguintes.

A cada resposta que recebia, mais eu ficava surpreso com a cartografia de um arquipélago de conceitos e experiências relatadas que eram desenhadas pelo meu interlocutor. E foi durante o período que mantivemos o diálogo que também ocorreu a II Jornada de Educação Libertária de Pelotas, que Paulo participou da organização, e a vinda do filósofo da educação (auto-intitulado antipedagogo) Pedro García Olivo a Porto Alegre. No entanto, foi também nesses mesmos dias que observamos uma kafkiana operação policial que dirigiu uma série de invasões a sedes de grupos anarquistas e de coletivos culturais da região metropolitana de Porto Alegre, buscando incriminá-los e interditar seus discursos e práticas através do letreiro de terrorismo e crime contra o Estado. É nesse contexto – que culminou no cancelamento da VIII Feira Anarquista de Porto Alegre – que entendo que se encontra reforçado a importância da publicação de um diálogo como esse, que é um alerta para os fascismos do mundo contemporâneo.

Paulo Lisandro Amaral Marques é graduado em História pela Faculdade Porto-Alegrense de Ciências e Letras (FAPA, 1999), especialista em Estudos Avançados em Sociologia pela Universidade de Granada, Espanha (2009), mestre em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS, 2006) e doutor em Sociologia pela Universidad de Granada, Espanha (2011). Atualmente é professor da Faculdade de Educação (FaE) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e coordena o grupo de pesquisa ‘Educação Libertária da Faculdade de Educação’. Em nosso diálogo, Paulo corporifica uma identidade que contrapõe a figura do intelectual de discurso profético, que, nas palavras de Foucault, “fala em nome de outro, fala para dizer um futuro que já tem” [1]. A perspectiva que constrói é um fazer intelectual e político que é atravessado por inúmeras práticas coletivas – como as okupações que ele mesmo menciona –, das quais ele é afetado e também as afeta, num jogo dialético interminável.

[1] FOUCAULT 2011, p. 29. Ver na lista na leituras indicadas.

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