Ano 06 nº 053/2018 – Vertigem solar
Por Natália Camargo Dutra
Destituída de sentimentos, sentada num banco de madeira umedecido pela neblina do dia anterior, observava um antigo campanário quando de repente percebi o nascer do sol dourado que parecia querer me acudir naquele momento de aflição. Comparei o instante com os momentos de felicidade da vida, quando as cores se tornam vibrantes. Segurei meu cachecol colorido sobre o peito, como que trazendo a mim um conforto. E, garanto, não foi um ato superficial e estético.
Até então eu não estava diferenciando o que via do que sentia. Os estímulos externos eram para mim como lapsos sinestésicos depois das noites de insônia. O sol era fascinante e brilhava de enrubescer a face. Mais adiante percebi que pairava no firmamento uma nuvem obscura como um sopro maquiavélico.
No meu peito correu uma sensação gelada e angustiante que não correspondia
mais àquele cenário. A nuvem se aproximava no mesmo ritmo frenético de meus
pensamentos. Tive então um desmaio de cores. Desloquei minhas emoções por uma
movimentação desconhecida e poética, flutuei entre a atmosfera azul escura e o escarlate, quando o vermelho intenso se curvou ao acinzentado. Duas cores sentimentais que jamais se fundirão. Perceber diferentes tonalidades/emoções me restabeleceu, não houve prejuízos e tudo ao redor se tranquilizou. O céu tornou-se límpido, depois que tudo pareceu desconectado, um pássaro melancólico de temperamento semelhante ao meu equilibrou-se sobre um fio. Senti um alívio reconfortante. Os conflitos ficaram registrados em um instante no tempo, talvez continuem ocultos em leves pensamentos, mas vigiando para sempre minhas percepções.
vejo que o estilo visceralmente descritivo permanece intacto, assim como o rubor das palavras. parabéns.