Sobre o amor e suas dores

Ana Isabel Souza

Há um poema escrito por Rupi Kaur (https://www.rupikaur.com/) que diz o seguinte: “Toda vez que você diz a sua filha que você grita com ela porque a ama, você a ensina a confundir raiva com bondade. O que parece uma boa ideia, até que ela cresça e passe a confiar em homens que a machucam porque eles se parecem demais com você.”

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(Imagem: http://rupikaur.tumblr.com/post/78034995091/rupi-kaur)

Desde a primeira vez que o li, senti como se fosse escrito para os homens que fizeram parte da minha vida. Para o meu pai, para o meu padrinho, e como uma forma de me acordar, também fora escrito para mim. Lembro de como passei a relembrar de cada momento que vivenciei próxima a eles, lembro-me de como foi assustador notar que o meu exemplo de relacionamento bem sucedido era um relacionamento tóxico.

Sei que não fui a única, todas nós somos criadas assim. Quantas vezes não ouvimos “eu faço isso porque te amo”, não é mesmo? É engraçado, não? Como nos cegamos diante de coisas óbvias em prol de uma falsa felicidade. Como nos deixamos levar pela ideia de sermos amadas, mesmo que isso nos fira.

Talvez tenha sido a morte do meu padrinho, ou o meu passado, ou este poema… Jamais saberei. A única coisa que sei é que lendo estas palavras decidi que jamais aceitaria homens como meu pai ou meu padrinho em minha vida.

Jamais aceitaria ser protegida em troca de abdicar de mim, de viver para uma relação que me aprisionaria. Jamais aceitaria este amor que machuca, mutila e diminui, este amor que nos faz sentirmos difíceis de sermos amadas. Desde o momento que prometi isto, minha vida se tornou uma batalha diária.

Nesta batalha, descobri que não há como amar o próximo sem se amar primeiro. Nós somos ensinadas a amar o outro, mesmo que doa, mesmo que mutile, mesmo que destrua. Mas não somos ensinadas a nos amar. E descobrir e enfrentar isso é doloroso, tão doloroso que há aqueles momentos em que ceder parece ser satisfatório. Se render a uma ideia de amor fajuta parece ser o certo.

Mas não é! Ninguém merece a sensação de não se pertencer, ninguém merece se render a algo que destrói. Ninguém merece aceitar que amor é sofrer. Mas, quando o seu maior exemplo de amor é uma prisão, é inevitável associar amor a dor. E como podemos aceitar isso? Como podemos aceitar como amor algo que te faz parecer uma pessoa difícil de lidar? Como podemos aceitar como amor algo que nos tira todos os dias a vontade de viver?

Hoje, com a mentalidade que tenho atualmente, tento entender a minha madrinha, ou a mulher que ela fora um dia, e como ela fora capaz de amar por tantos anos um homem que a tirou de si mesma. Não consigo entender, pois, hoje, depois de vê-los juntos por anos, sou capaz de compreender que aquilo não era amor.

Hoje, eu sei que amor tem uma definição própria a cada vivência, mas ele nunca significa sofrer ou mudar quem é para agradar. Ele é complexo e belo, incapaz de ser classificado ou explicado, ele é feito para melhorar vidas, trazer esperança e um porto seguro para dias dolorosos. Ele é feito para te fazer brilhar e não para te silenciar.

E ele surge primeiramente como amor próprio, pois é impossível amar o outro sem se amar primeiro. Por isso é tão doloroso. Bater de frente com algo que te ensinaram a odiar é doloroso.

Olhar para si mesma e aceitar cada defeito e qualidade é doloroso e nem sempre funciona, mas é um exercício diário. É um exercício diário se desarmar contra a única pessoa que você tem no mundo, você mesma. Mas é maravilhoso, pois quando você se aceita, se torna muito mais fácil escolher a si mesma. Quando você se ama, se torna mais fácil encontrar alguém que faça o mesmo.

Se amar é a maior arma e a maior cura que você pode ter contra os males do mundo, então use-a.

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