Ano 11 Nº 029/2023 – Nós, Vós e a Lei nº 10639 da LDB  (Lei de Diretrizes e Bases da Educação).

Por Rosana Rodrigues Lopes

Fonte: Kreuger(2014)

A maioria da população brasileira desconhece a Lei nº10639 que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB  nº 9.394/96) e permite o ensino da participação da população preta na História e construção do Brasil nos currículos escolares. Esta legislação revela o reconhecimento da existência da população preta e tem como objetivo combater  imagens degradantes de pessoas que foram escravizadas expostas em livros didáticos e a visão minoritária delas nas diversas áreas do conhecimento.  

Mas o que versa a lei nº 10639?

Art. 1º A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 26-A, 79-A e 79-B:

§ 1º O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à  História do Brasil.

§ 2º Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.

[…]

“Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência Negra’.” 

[…]

Art. 2º  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

(BRASIL, 2003).

Nós (eu e meus contemporâneos) somos as crianças que anteriormente a esta legislação infelizmente não encontraram semelhantes nas histórias infantis contadas pelas professoras do ensino fundamental. Nós (eu e meus contemporâneos) pouco convivemos com professores semelhantes a nós. Meus contemporâneos e eu não fomos informados de que descendentes de pessoas escravizadas teriam um dia, a oportunidade de ler, escrever um texto e entrar na Universidade. Falo do lugar de uma pessoa preta periférica e que conseguiu  concluir  o curso superior porque muitos de Vós (ancestrais) derramastes suor, lágrimas e sangue nas centenas de décadas de resistências e lutas. Vós deixastes muitos saberes,  gestos e ações que viraram  conhecimentos. Vós nos ensinastes o respeito às tradições. Mostrastes através das Irmandades que pensar no coletivo emancipa e nos torna mais fortes. Vós respeitastes a natureza fazendo dela o Sagrado, comprastes vossas liberdades e a dos irmãos, fostes os primeiros a empreender quando esta palavra nem existia e nos mostrastes que a África é um Continente tão diversificado quanto os tons de nossas peles.

A Lei citada  no início deste texto completou 20 anos em 9 de janeiro de 2023,  pouco sabemos da sua aplicação nas escolas públicas e privadas. Talvez desconheçam onde encontrar nossa história ou talvez acreditem que não a temos. Os cursos de Licenciatura deveriam fazer uso de fontes de pesquisas destinadas ao público preto para compreender a necessidade de aquilombamento como forma de preservação da espécie. Nestes territórios de resgates das lutas e conquistas do movimento negro, encontram-se as bases para as maiores reivindicações desta parcela da população, o direito a equidade e oportunidades na sociedade da época e atual. O combate ao racismo velado e a falsa democracia racial são problematizados pelos maiores especialistas em diversidade étnico racial nestas fontes.

O maior acervo audiovisual de cultura negra da América Latina está no Brasil e  chama-se: cultne.tv, cultne.acervo e cultne.audiovisual. O site disponibiliza filmes, documentários e entrevistas de temática racial de forma gratuita. O Quilombhoje também é um site bastante conhecido, que foi criado por participantes do Movimento Negro e divulga e comercializa Literatura Negra, entre elas estão os  Cadernos  Negros que são uma série anual de publicações em formato de livros, que reune contos, poemas e romances e dão visibilidade à escrita de autores (as) negros (as) no país. 

Temos o site,  literafro, questá presente na Internet desde 13 de dezembro de 2004, sediado no NEIA – Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Alteridade  –, da Faculdade de Letras da UFMG, onde é o Portal da Literatura Afro-brasileira com um vasto acervo. Estes são apenas alguns dos muitos locais em que podemos encontrar personagens e autores de mesma fenotipia. Nós estamos em todos os lugares, carregamos nosso brilho, nossa vaidade e competência para todos os espaços possíveis, naturalizando nossa presença onde sempre foi negada a entrada. Seguimos em frente com o maior ensinamento de Vós, a resistência, e a filosofia Ubuntu de que “Eu sou porque nós somos”.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Presidência da República. Lei n. 10.639, de 9 de janeiro de 2003. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências. Brasília, 2003. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm. Acesso em: 02 jun. 2023.

CULTNE. Insituto Cultne. [S. l.]: Cultne, [2020?].  Disponível em: Cultne. Acesso em: 16 jun. 2023.  

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS. Literafro. Minas Gerais: Núcleo de Estudos Interdisciplinares da Alteridade – NEIA, 2004. Disponível em: Quem Somos – Literatura Afro-Brasileira (ufmg.br). Acesso em: 16 jun. 2023.

QUILOMBHOJE LITERATURA. Blog Quilombhoje. [S. l.]: Quilombhoje, [2010?]. Disponível em: Quilombhoje – Navegue na literatura afro-brasileira. Acesso em: 16 jun. 2023.

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Rosana Rodrigues Lopes, 

Graduada em Letras Português e Literaturas de Língua Portuguesa pela Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA). Integra o Núcleo de Estudos Afro-brasileiro e Indígena (NEABI-Oliveira Silveira) CAMPUS BAGÉ.

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