Ano 05 nº 092/2017 – CRÔNICA: SOBRE SER PAI DE UM MENINO AUTISTA

males-2930460_960_720Carlos Juliani Lemos Vaz

 

Sou pai de um menino com transtorno do espectro autista, porém o grau dele é leve. Eu e minha esposa descobrimos que ele tinha autismo, mais ou menos, há uns quatro anos e antes de descobrirmos, obviamente, já suspeitávamos, devido a algumas características que nosso guri sempre apresentou: gostava e gosta de ficar isolado, demorou a falar e andar, entre outras coisas. Entretanto, como eu mesmo digo, “a gente sabe que ele é autista porque está escrito num laudo; do contrário, quem não o conhece não é capaz de afirmar essa condição dele”.

Assim, como pais responsáveis que somos, começamos a nos aprofundar mais e mais no assunto, até para sabermos como agir com nosso filho, que é um autista de alto desempenho. Ele é muito inteligente, “coloca a gente no bolso”, quando o assunto é informática. Adora assistir Discovery e outros canais científicos. Porém, como todo autista, ele tem comportamentos típicos. Um deles, e o mais marcante, é que ele entende apenas o sentido literal das palavras (como dizemos popularmente, leva tudo ao pé da letra). Compreender metáforas ou palavras de duplo sentido definitivamente não é com ele.

Justamente por isso, em casa aprendemos a lidar com esses comportamentos, e procuramos ‘ensinar’ àqueles parentes ou amigos que convivem conosco, ainda que não diariamente. Porém, até que nós mesmos aprendêssemos a lidar com essas características de nosso filho, muitas vezes situações engraçadas foram geradas, por conta dessa característica dele de “levar tudo ao pé da letra”.

Certa vez, minha irmã deu a ele, de presente, um par de luvas. Ele era pequeno e tinha ficado bem contente com o presente. Em determinado momento, enquanto brincava, aprontou uma arte, e ela precisou ralhar com ele. Ele ficou bem bravo por isso. Sem mais nem menos, tirou as luvas da mão e as jogou no chão. Ao ver isso, mandei que ele as juntasse, e tive como resposta: “Não quero mais esse presente, prefiro as minhas mãos!”

Por mais que minha autoridade de pai me dissesse que deveria repreendê-lo, ou mesmo colocá-lo de castigo, o que acabei fazendo, como não rir (ainda que secretamente) dessa fala inesperada? Minha irmã e meu pai também riram escondidos, após o episódio.

Outra ocasião, igualmente engraçada, aconteceu dias depois. Sucedeu que ele tinha acabado de voltar da escola. Assim que entrou em casa, perto da hora do almoço, disse para minha esposa:

– Mãe, vai demorar a ficar pronto o almoço?

Minha esposa respondeu:

– Não, está quase pronto. Espera um pouquinho.

Eu estava ouvindo a conversa, e perguntei a ele, fazendo uma brincadeira, dessas que a gente cresce ouvindo dos nossos pais:

– Tá com fome?

Ele respondeu:

– Sim, pai. Muita!

E eu rebati:

– Mata um homem e come!

E imediatamente comecei a rir da brincadeira, e essa atitude era a de se esperar de qualquer outra criança. Mas ele fez uma expressão, alguma coisa entre sério e incrédulo, e me disse:

– Não pai! Isso seria homicídio, canibalismo e antropofagia!

Não tive resposta para essa última fala, a não ser começar a rir.

Obviamente, depois dessa tiveram muitas outras situações, das quais damos boas risadas. Mas sempre com o devido respeito e carinho, pois bons pais precisam ser firmes com seus filhos, o que não impede que os respeitemos em suas individualidades e, acima de tudo, que os tratemos com muito carinho.

 

 

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