Ano 11 Nº 021/2023 – Conheça a vida e a obra da escritora Octavia E. Butler: A Grande Dama da Ficção Científica
Por Marina Rodrigues Lopes
Biografia:
- Quem é Octavia Butler?
Considerada um dos grandes nomes da ficção científica, Octavia. E. Butler foi uma escritora afro-americana que despontou no universo literário após vivenciar o ápice da segregação racial presente nos Estados Unidos entre os séculos XIX e XX. É reconhecida internacionalmente pelo grande impacto social causado por suas obras, que utilizam-se do conceito afrofuturista para apresentar o olhar da comunidade negra sobre a sociedade no presente e no futuro. Apesar disso, uma de suas obras mais aclamadas “Kindred: Laços de Sangue” só chegou ao Brasil no ano de 2017.
Fonte: Huff (2017).
“Comecei a falar sobre poder, porque era algo que eu tinha muito pouco.” – Octavia Butler
- Onde nasceu? Como foi a sua criação?
O interesse pela leitura:
Butler nasceu em junho de 1947, na cidade de Pasadena, Califórnia, onde vivenciou ao lado de seus pais as diversas formas de discriminação advindas da segregação racial vigente no país desde meados do século XX. Filha de um engraxate e de uma empregada doméstica, a autora teve uma infância carente de oportunidades de leitura. Em um de seus ensaios, em que a autora fala sobre seu processo criativo, denominado “Obsessão Positiva”, Octavia relatou que na sua infância, muitas obras literárias eram levadas a ela por sua mãe, a partir do descarte de livros e revistas feito pelos seus patrões.
- Como descobriu-se uma escritora?
O início de uma carreira brilhante:
Na mesma obra, a dama da ficção científica relembra a sua determinação ao desejar ser uma escritora de sucesso. Com apenas 12 anos, após assistir o filme “A garota diabólica de Marte”, dirigido por David McDonald, Octavia decidiu que se dedicaria a escrever uma história de ficção científica melhor do que aquela.
- Quando e como obteve reconhecimento na área?
Quase duas décadas depois, Butler começava a trilhar o caminho de sucesso que tanto sonhara com o reconhecimento das obras “Speech Sounds” e “Bloodchild”, quando foi premiada com os prêmios Hugo, um Locus e o prêmio Science Fiction Chronicle Reader Award for Best Novel.
Escrita:
Ficção e Afrofuturismo:
Um dos motivos que faz as obras de Octavia Butler terem tanto sucesso é a sua escrita envolvente e inesperada, que traz para a história ficcional temáticas sociais relacionadas à população afro-americana, como o racismo, o machismo, as relações de dominação e poder e o protagonismo negro. Em uma entrevista a In Motion Magazine, em 2004, Butler aponta que “Não há assunto que você não possa abordar por meio da ficção científica”, reafirmando a sua missão de dar voz a problemas sociais enfrentados pela população negra estadunidense ao longo da história.
Além de obter o título de Grande Dama da Ficção Científica, por ser reconhecida como a primeira mulher negra a ocupar um espaço de grande reconhecimento em uma bolha literária dominada por escritores brancos, Octavia também é considerada por muitos de seus seguidores como a mãe do afrofuturismo. Este movimento sócio-cultural caracteriza-se pelo encontro da ficção, da ancestralidade, da tecnologia e da fantasia em produções culturais e literárias que visam reconfigurar o presente e o futuro da comunidade afrodescendente.
Sucesso entre os leitores: “Kindred: Laços de Sangue”
Apesar de todo o sucesso de suas obras, a primeira obra da autora publicada no Brasil chegou quase 40 anos depois de seu lançamento nos Estados Unidos. “Kindred: Laços de Sangue” foi escrito por Butler na década de 70 e aborda questões ainda presentes na sociedade atual, o livro tem por característica ser atemporal e converter novos leitores aos encantos do gênero Literário ficcional.
“Kindred: Laços de Sangue” – Minha experiência
Por ocasião de um trabalho universitário tive a oportunidade de ler a obra e me apaixonei no mesmo instante pela escrita da autora. O enredo do livro é surpreendente e as distopias neste contexto de ficção científica são diferentes de tudo que já havia ouvido falar. Nunca demonstrei interesse por livros que retratam algo que não existe, por demandar muito esforço para compreender. Mas neste caso, a leitura me projetou para dentro da história onde me senti envolvida em cada conflito. Ao longo da história, Dana, a personagem principal, me surpreendeu com uma viagem no tempo e as consequências do que havia acontecido no passado. Acredito que a fluidez da escrita de Octavia e o envolvimento da obra não deixaram espaços para que a minha imaginação fizesse suas especulações. Ansiei pelo desfecho, ainda que não gostasse da ideia de que o mesmo representaria o fim do livro.
O livro de capa chamativa e justificável manteve seu enredo envolvente ao longo das suas mais de 400 páginas. Penso que não somente a história é envolvente como também a organização dos fatos e do modo como a conexão entre os personagens e os leitores acontece. Por vezes, a trama entre Dana e Rufus é interrompida por descrições acerca da vida que levava a jovem escritora junto de seu amado. Como se conheceram? Quando decidiram viver juntos? Como suas famílias aceitaram o relacionamento inter-racial? Questões como estas foram respondidas ao longo do livro, obviamente sem que isto fosse esperado pelo leitor.
Por fim, compartilho minha admiração por Octavia E. Butler diante da obra em questão e relembro a necessidade de encontrar livros como este, que fazem com que o ato de ler seja despertado e mantido, de forma a se espalhar para demais produções literárias.
Obras para conhecer e se apaixonar.
Ainda que o sucesso da mãe do afrofuturismo no Brasil seja recente, é possível encontrar algumas das suas obras mais aclamadas traduzidas para o português e publicadas pela editora Morro Branco. Sendo assim, que tal finalizar esta matéria com algumas indicações de leitura?
Trilogia Xenogênese: (Despertar – Vol.1, Ritos de Passagem – Vol. 2, Imago – Vol. 3)
O Padronista (Semente Originária, Elos da Mente, Arca de Cay) – 1976 – 1984
Filhos de Sangue e outras Histórias – 1995
Semente da Terra (Parábola do Semeador, Parábola dos Talentos) – 1995 – 1998
Prêmios e Reconhecimento internacional:
Após mais de 40 anos de carreira, Octavia E. Butler nos deixou em 2006, porém ao longo de sua carreira arrecadou grandes premiações por suas histórias, como os prêmios Nebula, por Parábola dos Talentos (2000), e Hugo, pelo conto Sons da Fala (2000).
“Uma boa história é uma boa história.” – Octavia Butler
REFERÊNCIAS:
LOUREIRO, Juliano. Saiba quem foi Octavia E. Butler, a rainha do afrofuturismo. Belo Horizonte: Bingo, 2020. Disponível em: Saiba quem foi Octavia E. Butler, a rainha do afrofuturismo (livrobingo.com.br). Acesso em: 19 fev. 2023.
ARTHUR MARCHETTO. Escotilha. A violência e as resistências em ‘Kindred: Laços de Sangue’. [S. l.]: A Escotilha, 2020. Disponível em: A violência e as resistências em ‘Kindred: Laços de Sangue’ (aescotilha.com.br). Acesso em: 19 fev. 2023.
ENAILE ALMEIDA E FÉLIX DE ALCÂNTARA. 75 anos de Octavia E. Butler, a “grande dama da ficção científica”. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, 2022. Disponível em: UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais – 75 anos de Octavia E. Butler, a “grande dama da ficção científica”. Acesso em: 19 fev. 2023.
HUFF, Amauri Terto do. Octavia Butler, a ‘primeira dama da ficção científica’ que reescreveu o futuro. São Paulo: Portal Geledés, 2017. Disponível em: Octavia Butler, a ‘primeira dama da ficção científica’ que reescreveu o futuro (geledes.org.br). Acesso em: 19 fev. 2023.
MEDEIROS, Tuanny. “Obsessão positiva”, por Octavia E. Butler. [ S. l.]: LetrasPretas, 2018. Disponível em: “Obsessão positiva”, por Octavia E. Butler – LetrasPretas. Acesso em: 19 fev. 2023.
CARETTIN, Carolina. Octavia Butler: mulher, negra e escritora de ficção científica. [S. l.]: Lado M, 2017. Disponível em: Octavia Butler: mulher, negra e escritora de ficção científica | by Carolina Carettin | Lado M | Medium. Acesso em: 19 fev. 2023.
Marina Rodrigues Lopes é graduanda do curso de Licenciatura em Letras: Línguas Adicionais – Inglês, Espanhol e Respectivas Literaturas, na Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), campus Bagé/RS. Na referida instituição, integra o Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (NEABI) Oliveira Silveira.