A força da mulher “Negra”: até quando?

Por Andréa de Carvalho Pereira

Vivenciamos no cotidiano a necessidade de atender expectativas, geralmente criadas e estabelecidas por indivíduos que não fazem sequer ideia de como é grande o peso dessa postura. Todas as cobranças são multiplicadas quando se trata de uma mulher negra, esperando que enfrente todos os obstáculos que surgirem com um sorriso no rosto, desde a dificuldade em conseguir uma remuneração adequada até o momento do parto. São inúmeras dificuldades enfrentadas, onde as violências muitas vezes são mascaradas pelas próprias vítimas.

Os números de feminicídios crescem de forma alarmante, deixando órfãos não somente as suas famílias, mas também a sociedade, já que a insegurança se propaga. Não existem mais lugares seguros, para as mulheres, em todos os lugares, infelizmente não existem garantias de integridade. No que tange esse aspecto, quando vamos nos aprofundar, para as mulheres negras, esse índice aumenta de forma negativa. 

Quatro mulheres foram mortas por dia no Brasil no primeiro semestre de 2022. Foram 699 feminicídios só até a metade do ano. Um aumento de mais de 3% em relação ao mesmo período de 2021. E quase 11% a mais do que no primeiro semestre de 2019. (GLOBO, 2023).

A realidade da mulher negra no que tange a sociedade, principalmente quando nos referimos ao Brasil, acaba impactando diretamente no tratamento social que é destinado às mesmas. O racismo se intensifica quando analisamos o gênero, já que na base da pirâmide conforme estudos divulgados é a mulher negra, que está em maior desfavorecimento com relação a direitos respeitados. A pandemia acabou agravando, ainda mais, essas discrepâncias sociais, aumentando seu sofrimento e diminuindo a possibilidade de manutenção da dignidade através da independência financeira.

Corroborando com essa perspectiva de dificuldade, Tadielo (2020), afirma que:

A pirâmide da sociedade brasileira se constitui de homens brancos no topo, seguido por mulheres brancas, homens negros e na base, mulheres negras. Neste sentido, não é difícil perceber os enfáticos impactos sociais das poucas políticas públicas, interseccionando no seu interior as estruturas racistas, patriarcais, sexistas e heteronormativas, levando em consideração a fundamental questão de gênero nesta matemática, em que as mulheres negras são potencialmente atingidas.

Apesar de existirem várias ações, de nada adiantará, se não for voltado um outro “olhar” para essas questões que são debatidas em todos os âmbitos sociais e acadêmicos, entretanto, sem efetiva mudança de cenário. A violência doméstica é uma realidade que nunca deixou de existir, considerando o número crescente de denúncias de agressões não somente físicas como também emocionais. 

Fonte: Schaly (2021).

A cobrança para que as mulheres consigam efetuar com sucesso todas as atividades impostas é uma premissa que não deixa de ser atribuída e imposta, e, quando se trata de uma mulher negra, é ainda mais agressiva essa abordagem. Os anos passam, e, infelizmente, é crescente o número de violências. A tentativa de desqualificar a competência e eficiência segue como uma campanha ferrenha de autoafirmação machista, onde o que ameniza essa postura social estabelecida são os coletivos que lutam para mudar essa triste realidade.

A mulher negra tem que redobrar, triplicar seu nível de sucesso em cada atividade proposta, e, mesmo assim, ainda receberá críticas e nem sempre terá seu reconhecimento pelo sucesso, mesmo que ele ocorra.

Consiste em uma postura inaceitável a manutenção de práticas reiteradas de silenciamento e invisibilidade de questões, que afetam diretamente a saúde da mulher negra, de uma forma ainda mais agressiva, como se fosse apenas um caso isolado. Lopes (2023) apresenta dados geográficos que apontam que as mulheres negras têm uma propensão mais elevada a sofrerem violência física e sexual no país.

 É imprescindível que se perceba que podemos elaborar práticas e leis aplicadas em que o feminicídio pode ser evitado, se as políticas públicas de fato forem efetivas e protegerem através do estabelecimento de critérios onde a prioridade seja a proteção de vítimas, principalmente as que estão em situação de extrema vulnerabilidade. 

As mulheres negras não precisam de julgamentos, de condescendência, precisam de oportunidades reais de mudar uma realidade imposta, onde são identificadas como “objeto” de posse.  O discurso e a prática devem andar juntos, de nada adiantará leis que não são cumpridas e posturas que não consolidam uma realidade de respeito e dignidade. 

Referências:

Lopes, Raquel. Negras têm maior risco de sofrer violência física e sexual. Folha de São Paulo, São Paulo, 2023. Disponível em: Negras têm maior risco de sofrer violência física e sexual – 20/06/2023 – Cotidiano – Folha (uol.com.br). Acesso em: 07 ago. 2023.

GLOBO. Mulheres negras representam 62% das vítimas de feminicídio no Brasil, aponta Anistia Internacional. Bom dia Brasil, Rio de Janeiro, 2023. Disponível em: Mulheres negras representam 62% das vítimas de feminicídio no Brasil, aponta Anistia Internacional | Bom Dia Brasil | G1 (globo.com). Acesso em: 09 ago. 2023.

RIBEIRO, Djamila. Quem tem medo do feminismo negro? Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2018.

SCHALY, Marcia. A violência de cada dia: Mulheres Negras continuam sendo as maiores vítimas. PsiSocial, Curitiba, 2021. Disponível em: A violência de cada dia: Mulheres Negras continuam sendo as maiores vítimas – Coletivo Psi Social. Acesso em: 27 jul. 2023. 

TADIELO, Cristina. Os desafios da mulher negra na sociedade brasileira. Notícia Preta, Rio de Janeiro, 2020. Disponível em: Os desafios da mulher negra na sociedade brasileira – Noticia Preta – NP. Acesso em: 13 ago. 2023.

Graduada em Administração de Empresas pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande – FURG (2001). Graduada em Biblioteconomia pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande- FURG (2006). Pós-Graduada com Especializações em: Gestão em Arquivos pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM (2011) e Rio Grande do Sul: Sociedade, Política e Cultura pela Fundação Universidade Federal do Rio Grande – FURG (2011). Bibliotecária do Campus Bagé da Universidade Federal do Pampa. Coordenadora do Neabi Oliveira Silveira – Unipampa, Campus Bagé. Mestra em Ensino pela Universidade Federal do Pampa – Unipampa, Campus Bagé (2021). 

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