Cloroquina é eficaz contra covid-19?

WhatsApp Image 2020-04-07 at 5.34.11 PM (1)                                                                                             Por: Taiza Fonseca

 

Recentemente, o Ministério da Saúde divulgou um documento técnico no qual recomenda novas diretrizes a serem seguidas nos hospitais do Brasil, a de que os médicos receitem a hidroxicloroquina e a cloroquina para uso em pacientes diagnosticados com covid-19 já nos estágios iniciais da doença, mesmo que ainda não exista nenhuma evidência científica de que a droga tenha eficácia nesse tratamento em específico e é necessário que o paciente autorize o tratamento, declarando que tem conhecimento de que a droga pode levar a morte. Atualmente, o uso da droga é permitido no tratamento de pacientes que contraíram malária, artrite reumatóide, lúpus e em alguns casos de doenças autoimunes.

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                                                         (Documento liberado pelo Ministério da Saúde)

 

A preocupação que se assinala nessa liberação tem relação com os efeitos colaterais que a droga pode causar durante seu uso, como arritmia cardíaca, taquicardia, dores abdominais agudas, problemas neuropsiquiátricos, náuseas, convulsões, vômito, problemas nos rins, dentre outros efeitos que podem existir dependendo do caso clínico do paciente.

Inclusive, a pesquisa que estava sendo realizada no Brasil foi encerrada, da Equipe CloroCovid-19, formada por 26 cientistas de vários instituições do país, e concluiu que a droga viria a ser nociva para a saúde dos pacientes, em que dos 81 voluntários, 11 deles vieram a falecer pelos efeitos colaterais do uso da cloroquina. [1] O mesmo estudo já havia sido desenvolvido em outros países como a China e os EUA, tendo obtido resultados semelhantes à pesquisa realizada no Brasil. A OMS – Organização Mundial da Saúde estava desenvolvendo um estudo em mais de 100 países para verificar a eficácia da droga no tratamento contra a covid-19 e no dia 25 de maio, assim como no Brasil, encerrou tal estudo, e apontou que o encerramento se deu através da constatação de que a cloroquina aumenta a taxa de mortalidade de pacientes infectados pelo vírus. 

Apesar das declarações da classe médica e científica ao redor do mundo, o atual presidente o Brasil defende o seu uso indiscriminadamente, em uma de suas lives que faz diariamente no facebook, Bolsonaro afirmou “Aplica logo, pô”, disse. “Sabe quando esse remédio começou a ser produzido no Brasil? Ele começou a ser usado no Brasil quando eu nasci, em 1955. Medicado corretamente, não tem efeito colateral”, afirmou.

Em virtude desse relato, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) lançou uma nota técnica reiterando os riscos no uso do medicamento: “Apesar de promissores, não existem estudos conclusivos que comprovam o uso desses medicamentos [hidroxicloroquina e cloroquina] para o tratamento da Covid-19. Assim, não há recomendação da Anvisa, no momento, para o uso em pacientes infectados ou mesmo como forma de prevenção à contaminação. Ressaltamos que a automedicação pode representar um grave risco à sua saúde”. [2]

Por isso, trago o relato da Izabella Delfino, 23 anos, de Niterói, Rio de Janeiro, que é estudante da UFF – Universidade Federal Fluminense, e que já fez o uso da cloroquina no tratamento contra malária (que é uma das doenças nas quais o uso do remédio é recomendado). Bella nos conta que contraiu malária no estado do Pará em 2018, onde havia feito uma visita para desenvolver uma pesquisa a convite do Laboratório de Justiça Ambiental de um programa de pós-graduação da UFF. Izabella Delfino foi diagnosticada 15 dias após o contato com a doença e foi tratada no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Rio de Janeiro, e assim que houve o diagnóstico, a cloroquina foi administrada no tratamento.

“Muito importante dizer que a malária é uma doença muito debilitante, uma anemia muito grave, mas os efeitos colaterais da cloroquina são muito específicos e muito fortes. Com certeza foi a pior parte de ter malária, tanto que durante 5 dias de internação, esse medicamento foi suspenso duas vezes, eles tiveram que trocar porque comecei a relatar enjôos e náuseas muito fortes e como ele é tomado por via oral não era útil que eu fizesse o uso do medicamento para colocar ele para fora. Chorei muito durante esses dias, pois não conseguia me alimentar direito, dormir direito, precisava de ajuda para me locomover e tive alterações gastrointestinais que nunca havia sentido antes como fezes com espuma, não era algo da malária, e isso que eu já estava doente da malária 15 dias antes disso. Parecem efeitos colaterais muito bobos, mas quando você está tão debilitado assim, qualquer momento de paz e descanso que você não consegue ter é um momento que te deixa ainda mais debilitado e frágil mesmo.” Disse Bella sobre esse período. A jovem também nos conta que sua frequência cardíaca era verificada com frequência por conta da malária, mas ainda mais reforçada por conta dos riscos que o medicamento apresenta. Apesar de reconhecer que a droga foi importante na sua recuperação, Bella nos conta que sente pavor ao ver pessoas utilizando a cloroquina indiscriminadamente, e avisa que este medicamento pode matar.

image2                  (Foto concedida por Izabella  do período em que estava internada na Fiocruz.)

 

Por fim, é muito importante que as pessoas não se automediquem, principalmente porque essa droga apresenta grandes riscos à saúde se usado fora de um ambiente controlado e prescrito. Sabemos que o maior desejo no atual momento é que um remédio milagroso surja para nos salvar, mas isso só ocorrerá através de estudos, testes científicos que garantam a qualidade e segurança para esse uso. Apesar das recomendações do atual presidente, devemos compreender que essa não é a recomendação de quem realmente estuda e entende do tema, que são os profissionais da saúde e os órgãos que são responsáveis pelas pesquisas científicas, a melhor recomendação que temos atualmente para combater a covid-19 é o isolamento social, se você puder, fique em casa. Tempos melhores virão.

 

Quer saber mais sobre a experiência de Bella com a cloroquina? Parte da entrevista incorporada nessa coluna foi transcrita, confira a entrevista completa que ela concedeu para o PET – Letras para a 11° edição da Rádio Uni: https://youtu.be/yvOj7RDElb8

 

[1]https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/04/13/estudo-com-cloroquina-e-interrompido-apos-efeitos-colaterais-em-pacientes.htm

[2] https://www.ictq.com.br/politica-farmaceutica/1328-contrariando-a-bula-bolsonaro-afirma-que-cloroquina-nao-tem-efeito-colateral

Indicação de leitura com dados mais específicos e completos: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-52686122

Posicionamento da OMS: https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/05/20/oms-recomenda-que-cloroquina-e-hidroxicloroquina-so-sejam-usadas-contra-a-covid-19-em-ensaios-clinicos.ghtml

Encerramento do estudo pela OMS: https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/05/25/oms-suspende-testes-com-hidroxicloroquina-contra-a-covid-19.ghtml

 

 

Taiza da Hora Fonseca é Acadêmica do curso de Letras Português e Literaturas de Língua Portuguesa na Universidade Federal do Pampa, fez parte do Diretório Acadêmico de Letras no período de 2015 a 2017 e participou como bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) no período de 2016 a 2018. Atualmente faz parte do PET – Programa de Educação Tutorial e seus interesses são: Temas Transversais, Política e Movimentos Sociais, Literatura, Poesia e Arte.

 

 

 

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