Ano 05 nº 076/2017 – Nós somos mais do que isso!
Autores: Flávia Azambuja e Maria Augusta Tellechea
O que te deixa constrangido? O que é constrangimento pra você?
Segundo o Dicionário Priberam da Língua portuguesa é
cons·tran·gi·men·to
substantivo masculino
- Ato de constranger.
- Violência que tira liberdade de ação.
- Acanhamento, embaraço.
O juiz José Eugenio do Amaral Souza Neto parece ter uma definição de constrangimento que diverge da apontada em dicionários, já que um dia após ocorrido um assédio sexual liberou o homem que havia sido preso por esse crime. Lembrando que o assédio não é somente o ato físico, pode ser caracterizado de várias formas, inclusive como o constrangimento. Assédio é crime e pode ter uma repercussão enorme na vida de quem o sofre, tanto o assédio físico como o assédio moral podem deixar marcas profundas no psicológico das pessoas, e nas maiores vítimas disso, as mulheres.
Você deve ter ouvido falar no caso de grande repercussão que aconteceu em um ônibus em São Paulo, em que um homem ejaculou no pescoço de uma passageira que dormia. Não bastasse a situação já ser horrível o suficiente, ela ainda piora. O juiz mencionado liberou logo em seguida o assediador preso em flagrante. Diego Ferreira de Novais depois de ser liberado cometeu o mesmo crime no dia em que escrevíamos esse texto, 02 de setembro, 4 dias depois de ser liberado. Pra agravar ainda mais a situação não era a primeira vez que ele havia cometido esse tipo de delito. Agora ele está preso, esperamos que por muito tempo, mas o que esse caso diz sobre a nossa sociedade e sobre o papel ocupado por nós mulheres nela.
Vivemos em um mundo em que precisamos constantemente reforçar o óbvio, é cada vez mais difícil ser mulher, quando deveria ser o contrário, a mulher, na maioria das vezes, tem a sua credibilidade questionada e é desacreditada. Ao invés de ser considerada vítima em situações como essa é tida como culpada. Por que estava sozinha? Por que saiu tão tarde? Por que usa essa ou aquela roupa? E por aí vai…
Depois desse caso, surgiu uma verdadeira enxurrada de outros tantos, em que a mulher ao ser espancada e delatar a agressão, é questionada e ridicularizada ouvindo perguntas do tipo: você tem certeza de que não caiu ou se bateu em algum lugar? Eu mesma já passei por algo semelhante, já me vi desacreditada pelo simples fato de ser quem eu sou, mulher.
Ao ir a uma delegacia registrar uma ocorrência sobre um abandono de uma pessoa idosa, tive meu depoimento colhido, até aí tudo dentro da normalidade, após um tempo de exame do policial, até então muito atencioso, fui interrogada sobre minha idade e profissão, após mais alguns segundos de avaliação, fui recomendada a solicitar que meu pai prestasse o depoimento, visto que era homem e mais velho, assim teria mais credibilidade o caso. E eu me pergunto por quê? Por que minha palavra não bastava? Por que o que eu dizia tinha de ser validado por um homem? E se minha queixa fosse especificamente contra um homem e mais velho em que será que acreditariam?
Atitudes como essas explicam o porquê de muitos homens reproduzirem esse tipo de comportamento ao longo da vida, e verem o corpo da mulher como objeto de recreação, já que a maioria não é punida. As mulheres simplesmente não têm coragem de denunciar, pois sabem o tratamento que receberão caso o façam, ou quando enfim resolvem dar uma basta e, assim passam por todo tipo de constrangimento e, em muitos casos, percebem que tudo foi em vão, pois absolutamente NADA muda e esse ciclo horrível de abuso, de descrédito, continua. Porém devemos sim denunciar e não nos calar a essas injustiças, a nossa voz precisa ser ouvida e essa cultura precisa ser mudada.
No Brasil, o número da central de atendimento à mulher é 180.
Este é um fruto da Oficina de Escrita, ofertada pelo Laboratório de Leitura e Produção Textual em parceria com a oficineira Vanessa de Almeida Marques.