Ano 07 nº 026/2019 – Resenha de “Our Madness”

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 Por Christian Flores

“Our Madness” é um filme moçambicano e português dirigido por João Viana. Foi lançado em dezembro do ano de 2018, e debutou no Brasil no 11º Festival Internacional de Cinema da Fronteira em Bagé em abril do ano de 2019. Na ocasião, foi alardeado como o melhor filme do festival. Além ganho também no Festival IndieLisboa, o mais importante festival de filmes no Portugal. 

O filme leva ao espectador pela loucura de seu personagem principal Lucy, que está internada num hospital psiquiátrico, sonhando em se reunir com seu filho e seu esposo, Zacaria. Um dia Lucy tem a oportunidade de escapar. Partindo dali, Viana leva ao espectador por uma viagem surreal, onde não se pode distinguir o real do imaginado. A gente atravessa passagens urbanas, rurais, e naturais por tudo Moçambique, seguindo a Lucy e sua cama de hospital, que acompanha a ela pra fazer lembrar ao espectador que nem tudo o que está acontecendo é certo.

Assistir o filme é como assistir um sonho ou um trauma. Se pode entender que Lucy está voltando a viver a perda de seu filho. Como num sonho, a esperança de poder trocar o acontecido é o que motiva o enredo. Mas reencontros e momentos felizes voltam rápido em pesadelos e realidades ruins. Como num trauma, essas realidades se voltam a viver uma e outra vez.

O filme se realça por apresentar Moçambique com uma perspetiva fora do olhar colonialista. Apesar de ser um filme português e moçambicano, ambos países onde a língua oficial é o português, é filmado completamente em swahili, uma das línguas nativas do moçambique. A cenografia realça paisagens moçambicanas e a narrativa destaca problemas atuais de Moçambique que são herança da colonização, como o tráfico humano de órgãos. Numa das cenas mais comoventes, Lucy e Zacaria sussurram os nomes de algumas das tragédias mais fortes na história da humanidade, desde o Auschwitz e Hiroshima até My Lai e o Chile de Pinochet. Nesse contexto inserem a perda de seu filho, símbolo de um efeito da colonização, nessa narrativa de grandes tragédias.

É um filme difícil de assistir, sem dúvida. Feito num país diferente, numa língua diferente, num continente diferente e num cérebro diferente. É difícil entender o contexto do filme para quem não conhece muito sobre Moçambique. É como vivenciar um trauma alheio, tão distante a nossa realidade, mas feito tão próximo pelas atuações de seus personagens principais. O filme é um thriller, mas apresentado como uma obra de poesia. E assim como os problemas do colonialismo em Moçambique não tiveram resolução, o filme deixa o espectador sem uma resolução satisfatória. Justo por isso é um filme importante de assistir.

Eu recomendo o filme para pessoas aficionadas aos thrillers psicológicos e para quem gosta do cinema mundial. “Our Madness” oferece uma forte crítica ao mesmo tempo que deixa o espectador instigado e em suspense. Mas até para quem não gosta de thriller, Viana faz o filme de um jeito tão artístico e poético que vale a pena só pela beleza de um cinema autônomo africano.

Christian Flores, de Chicago, IL, é um bolsista Fulbright dos Estados Unidos ensinando inglês na Unipampa. Ele foi formado em história, ciência política e espanhol na Illinois College, em Jacksonville, IL. Decidiu vir ao Brasil para aprender uma terceira língua e atualmente está tomando aula de Português para estrangeiros através do programa Idiomas Sem fronteiras da Unipampa. Antes de ensinar, ele trabalhava para o Senado dos Estados Unidos.

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