Ano 09 nº 055/2021 – Resenha da série de obras “Nove discursos de Commodus” de Cy Twombly

Por Cátia Cilene Saraiva Avero, Flávia Azambuja, Janaína Wayne Herbstrith, Kassandra Naely Rodrigues dos Santos, Maria Luísa Marques de Ornelas e Willians Jardim Barbosa

Cy Twombly foi um artista que viveu de 1928 a 2011, além de pintor, era escultor e fotógrafo. Considerado um dos ícones dos movimentos de vanguarda, especialmente pelas rupturas dentro da linguagem do expressionismo abstrato e um dos precursores da arte conceitual. Ele foi conhecido por suas pinturas rabiscadas que, por vezes, pareciam pichações. Seu estilo, chamado de “simbolismo romântico”, foi influenciado por mitos clássicos e poesia. Ele, com seu trabalho, se enquadra também em estilos como o minimalismo, o neo-expressionismo e o expressionismo abstrato.

A série em si representa um signo icônico por ser uma obra que teve bastante significado no final do século XX. O título da obra faz referência à morte do imperador Commodus. O ano da obra é o mesmo ano do assassinato do presidente John F. Kennedy. Assim, o artista retoma e atualiza a violência vivida pelos dois líderes, ambos assassinados de maneira violenta. A forma como esses assassinatos figuram na obra se dá pelo uso da tinta vermelha para “imitar” o sangue derramado.  No quadro três, a tinta remete ao tiro que levou Kennedy à morte.  A tinta vermelha pode ser a representação do sangue jorrado no assassinato do presidente e manchando sua esposa, Jacqueline Kennedy, o que talvez explique a diminuição da tinta vermelha no último quadro da série, como se ela pudesse se limpar desse sangue física e metaforicamente.Twombly chegou a afirmar na época “Não devemos sucumbir à violência” em relação a esta obra. Ainda sobre a iconicidade presente na obra, na parte VI, parece haver uma semelhança com lágrimas, como se representasse o sofrimento relacionado às mortes.

O tratamento da pintura, a evidência da presença do pintor nas composições (pelos traços, texturas, marcas etc) é um signo indicial. E mesmo que em menor grau, enquanto índice, há a semelhança dos pingos de tinta com sangue representando a violência em relação ao assassinato do Imperador Commodus – referência da série de quadros – se analisarmos como uma interpretação isolada dentro do todo do objeto.

A primeira tela é a única com cores menos quentes, no qual predomina o branco, cor que pode ser considerada um símbolo da paz. O primeiro discurso de Commodus/Kennedy, então, seria um discurso pacificador. Na segunda tela, no entanto, aquela paz não existe mais. É um vermelho caótico que podemos considerar como um elemento associado ao sangue, devido ao conhecimento sobre a obra. O discurso de Commodus/Kennedy aqui é como se fosse um aviso de que há algo errado. A terceira tela apresenta o vermelho escorrendo, fazendo relação com o sangue de Commodus/Kennedy – um pedido de ajuda por sua vida. Na quarta tela é como se o organismo vital de Commodus/Kennedy se aglutinasse novamente a fim de sobreviver. A última parte da obra acelera o processo vida vs morte de Commodus/Kennedy: a sétima tela com o vermelho ocupando toda a extensão da figura; a oitava apresentando uma explosão de vermelho, novamente escorrendo, e as cores como um todo em um tom de ‘’podridão’’ – podridão essa melhor retratada na última tela, onde não há mais vida, não há mais luta, não há nem mais paz, apenas o que já ‘’foi’’.

A estética da série apresenta uma linguagem simbólica do movimento e época (contexto) em que o artista Cy Twombly estava inserido. O próprio fato de a obra ser abstrata, a  torna extremamente simbólica, há pista do que o artista trata na obra, como o título, por exemplo. O título nos ajuda a compreender todo o simbolismo dessa abstração, assim como informações sobre o autor, ser dos Estados Unidos e viver na Itália e sobre o contexto da época em que a obra foi realizada, a morte de John F. Kennedy. Sobre o conhecimento da história do artista, foi de extrema importância saber um pouco sobre sua trajetória e os diversos caminhos que percorreu na sua poética artística. Foi fundamental saber, por exemplo, sobre seu casamento com uma italiana, já que viveu parte de sua vida dividido entre os Estados Unidos e a Itália. Na Itália se interessou pela mitologia romana, o que parece ter influenciado muito a obra analisada, pois uma das mortes tratadas é de um imperador romano. Além  disso, saber que ele era um artista estadunidense nos ajuda a relacionar a obra, e talvez seu sentimento, à morte de John F. Kennedy, já que a morte do presidente causou muita comoção em seu país de origem. 

Buscar outras obras do autor foi fundamental para perceber a presença de formas abstratas em quase toda sua obra, além da cor vermelha que também aparece presente em muitas de suas obras, nos permitindo ter noção da poética do artista. Entre essas obras, é possível observar algumas constantes, além do uso de tons quentes como o vermelho e o laranja (em séries como o intitulado Camino Real), por exemplo, obras trabalhadas em branco, preto e cinza, remetendo à naturezas mortas; e outras baseadas em emaranhados de traços finos em um suporte em branco.

Uma de suas obras que mais nos chamou a atenção foi a série The Rose, no qual o artista retrata três rosas em diferentes matizes. Na primeira tela da série, as rosas estão representadas em um tom de amarelo ‘’sol’’; na segunda em vermelho vivo; na terceira, entre amarelo e azul, criando um contraste forte; a quarta com vermelho fortíssimo, já nem aparecendo mais suas pétalas, aproximando-se de um borrão no lugar das rosas. Porém, o mais impactante é a última tela, com o que era rosa sendo agora representado em preto, como se tivessem sido carbonizadas. Assim como na natureza, em seu processo de nascer e renascer – o que pode ser relacionado com o que descrevemos em relação à morte na série analisada.

Referências:

SILVA, Adriana Ferreira. Cy Twombly ganha em Paris maior retrospectiva de sua obra. O Globo. 2016, Cultura. Disponível em: https://oglobo.globo.com/cultura/artes-visuais/cy-twombly-ganha-em-paris-maior-retrospectiva-de-sua-obra-20563524

Varella, Paulo. Como Cy Twombly influenciou a arte contemporânea. Arte/Ref. 2020. Disponível em: https://arteref.com/arte-do-dia/como-cy-twombly-influenciou-a-arte-contemporanea/