Ano 05 nº 033/2017 – É tempo de não durar, e você não é o culpado
Stéfany Solari
Estudante de Licenciatura em Letras- Português
Passei minha adolescência de modo não muito comum, ou melhor, não aquilo que todos esperam de um jovem com os seus hormônios à flor da pele. Passei em casa, lendo ou escrevendo, meu sonho era ser escritora ou psiquiatra… Mas ao longo do tempo essa vontade foi morrendo dentro e fora de mim, larguei os livros e as palavras, pouco escrevi sobre o que me agonizava e fazia dar um certo ar poético à minha adolescência deprimida e sem sal. Fui obrigada a amadurecer muito rápido, trabalhar cedo e não pensar em outras coisas além de ser independente do dinheiro do meu pai. Passei na minha adolescência todo o processo de divórcio dos meus pais, comecei a entender o motivo, não confiar nos homens, não conseguir me aproximar deles, pois nunca mais esqueci, meu pai, uma vez, quis ter uma conversa comigo, um dia, me explicou algumas coisas e disse: “ – Quando tu fizer 16 anos eu vou te ensinar e te explicar algumas coisas que te ajudarão”. Nunca chegou esse dia, e eu fiquei à deriva, mas tenho quase certeza que era sobre sexo. Meu pai é muito machista, fez com que eu me criasse em um sistema que ao invés de me libertar, conseguia me aprisionar mais. Lembro que quando descobri o motivo do divórcio dos meus pais eu caí em choque, pois meu pai tinha traído a minha mãe dentro de casa, com alguém próximo. Mas o pior foi depois, fui despejada literalmente da minha própria casa, minha sorte foi que a minha avó materna ofereceu uma casa para morarmos, não passamos fome porque a família da minha mãe ajudou. Tudo isso que passei durante a minha transição da adolescência para a vida adulta fez com que pegasse muita raiva da figura masculina, na minha vida, atrapalhando-me de ter qualquer relacionamento saudável com alguém. Na verdade, eu nunca consegui. Recordo que o dia que o meu pai saiu de casa, ele disse para mim: “ – Volto logo, filha.”, nunca voltou. Acabou que construí uma barreira dentro de mim, esse escudo, fazendo acreditar que todo o casamento ou qualquer relação afetiva iria e irá sempre terminar de alguma forma desastrosa. Acabou que cada vez fui ficando mais distante dele, e nossos contatos atualmente são em frente ao juiz, e isso me dói tanto, e me faz pensar o ponto que a nossa relação pai/filha chegou. Demorei muito tempo para notar que o meu sério problema com relacionamentos afetivos estava intimamente ligado à figura masculina e paterna na minha vida, demorei muito tempo para perceber esse problema, que acabou se tornando na minha vida. Isso acabou se tornando um grande problema na adolescência. A gente quer se descobrir, a gente quer sentir sensações novas, a gente quer viver tudo aquilo como se fosse a última vez… Passou um tempo, após fazer terapia, em que eu achava que todas as pessoas, com quem eu já me relacionei, eram pessoas extremamente complicadas. Consigo ter uma vida sexual ativa, porém essas relações são muito vazias, sem significado nenhum. Acredito que meu grande problema é o medo de sofrer, o qual faz com que eu crie situações vazias com pessoas vazias. Certo dia um amigo meu citou o sociólogo Bauman, onde ele aborda em um dos seus livros a fragilidade dos laços humanos, chamado “ Amor líquido”, onde ele relata:
“ (…) a definição romântica do amor como “até que a morte nos separe”está decididamente fora de moda, tendo deixado para trás seu tempo de vida útil em função da radical alteração das estruturas de parentesco às quais costumava servir e de onde extraia seu vigor e sua valorização. Mas o desaparecimento dessa noção significa, inevitavelmente, a facilitação dos testes pelos quais uma experiência deve passar para ser chamada de “amor”: Em vez de haver mais pessoas atingindo mais vezes os elevados padrões do amor, esses padrões foram baixados. Como resultado, o conjunto de experiências às quais nos referimos com a palavra amor expandiu-se muito. Noites avulsas de sexo são referidas pelo codinome de “fazer amor”.” ( p.10, cap. 1)
Depois de analisar esse contexto das relações humanas, que andam tão fragilizadas, onde vivemos na era das “ relações descartáveis, amores livres, poligamia” e entre outras tantas relações humanas vazias, percebo que vivemos em uma geração traumatizada, nossa geração desconhece o que é responsabilidade afetiva, muitas vezes trocamos qualidade por quantidade. Por muito tempo me senti culpada por não conseguir manter uma relação afetiva séria com ninguém, culpei muitas vezes a relação conturbada que tenho com o meu pai, como uma forma de dificuldade em manter relações afetivas com pessoas, que não sejam casuais. Aos poucos descobri que não é culpa dele, não é minha e de mais ninguém. Nós acabamos procurando diversas respostas para os problemas que nos rodeiam, mas atualmente vivemos em uma sociedade muito competitiva e também doente que permite que certas atitudes invadam a nossa vida. E, sim as relações afetivas, por mais que digamos que não passam de casuais, interferem no nosso dia a dia.