Ano 13 Nº 32/2025 – Agosto De Memória E Resistência: Celebrando Oliveira Silveira

Por: Mauricio Nunes; Vitória Vasconcellos

Foto: Tânia Meinerz

Agosto é mês de memória e resistência para o nosso NEABI. É quando, no silêncio que antecede a primavera, recordamos o nascimento daquele que iria se tornar um dos principais intelectuais e militantes do movimento negro brasileiro: Oliveira Ferreira Silveira (1941–2009). Nosso núcleo leva seu nome não por acaso, mas por reconhecer nele um farol de consciência histórica e compromisso político com a luta antirracista e a valorização da cultura afro-brasileira.

Nascido em Rosário do Sul, no interior do Rio Grande do Sul, Oliveira Silveira cresceu em um país que insistia em invisibilizar a presença e a contribuição da população negra em sua formação histórica e cultural. Formou-se em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e, paralelamente à docência, construiu uma trajetória literária marcada pelo engajamento. Poeta de verbo afiado e sensibilidade profunda, Oliveira soube unir a palavra estética à palavra política. Para ele, poesia não era refúgio distante da realidade, mas trincheira: “A poesia deve dizer alguma coisa. Não pode ser vazia. Não pode ser desligada da vida” (Silveira, 2008).

Nos anos 1970, em plena ditadura militar, Oliveira integrou o Grupo Palmares, coletivo que se dedicava à pesquisa e à promoção da cultura negra. Foi nesse contexto que surgiu a proposta de substituir o 13 de maio — data da assinatura da Lei Áurea — pelo 20 de novembro como marco da Consciência Negra. Essa escolha resgatava a memória de Zumbi dos Palmares, morto em 1695, e, com ela, uma narrativa de luta e resistência, em oposição à visão passiva de “benevolência” associada à abolição oficial. A proposta ecoou em todo o país, sendo incorporada por movimentos negros e, posteriormente, oficializada como feriado em diversos municípios e estados. Em 2011, a Lei nº 12.519 instituiu oficialmente o Dia Nacional da Consciência Negra em 20 de novembro e, mais recentemente, a Lei nº 14.759/2023 estabeleceu esta data como feriado Nacional em homenagem a Zumbi dos Palmares, símbolo da resistência negra contra a escravidão.

A obra de Oliveira Silveira é diversa e profundamente conectada à história afro-brasileira. Em livros como Banzo (1970), Roteiro dos Tantãs (2002) e Orixás (2003), ele constrói um universo poético que transita entre o lirismo, a memória coletiva e a denúncia social. Termos como “tantãs”, “orixás” e “banzo” não são apenas palavras: são pontes para universos de significado que remetem à diáspora africana, à religiosidade, à resistência e ao sentimento de perda e saudade ancestral. Sua escrita recorre a imagens da terra, da cor, da música e do corpo para afirmar a presença negra como parte viva e incontornável do Brasil. Como afirma em um de seus versos: “É preciso lembrar, sempre lembrar: cada 20 de novembro é flor no asfalto” (Silveira, apud Santos, 2014).

Ao batizar nosso Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas como NEABI Oliveira Silveira, assumimos uma herança. Essa herança não se limita a celebrar a figura de um poeta consagrado, mas a assumir um pacto de continuidade: pesquisar, divulgar e viver as culturas negras e indígenas com dignidade, consciência e ação transformadora. Inspirados em Oliveira, entendemos que educação é também ato político, capaz de combater o racismo estrutural, valorizar saberes marginalizados e criar espaços de escuta e protagonismo para quem historicamente foi silenciado.

Agosto, para nós, é tempo de semear. É o mês em que renovamos nossa missão e relembramos que cada palavra, cada projeto, cada ação educativa pode ser — como na obra de Oliveira Silveira — um gesto de resistência e de esperança. Que possamos, como ele, fazer de cada verso e de cada ação um ato de libertação.

Por fim, convidamos todos os leitores a assistirem ao curta documental dirigido por Camila de Moraes e realizado pela Casa de Cultura Mario Quintana — uma homenagem sensível e potente à trajetória de um dos grandes nomes da luta pela valorização da identidade negra no Brasil.

Referências:
BRASIL. Lei nº 12.519, de 10 de novembro de 2011. Institui o Dia Nacional da Consciência Negra. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 nov. 2011.

SILVEIRA, Oliveira. Banzo. Porto Alegre: Edição do Autor, 1970.

SILVEIRA, Oliveira. Roteiro dos Tantãs. Porto Alegre: Edição do Autor, 2002.

SILVEIRA, Oliveira. Orixás. Porto Alegre: Edição do Autor, 2003.

SILVEIRA, Oliveira. Entrevista ao programa Café TVCOM. Porto Alegre: TVCOM, 2008.

SANTOS, Flávia. Oliveira Silveira e o 20 de novembro: literatura e luta antirracista. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2014.

TELES, Jovina. “Grupo Palmares e a construção da Consciência Negra no Brasil”. Revista Estudos Afro-Brasileiros, v. 6, n. 2, 2017.

Autores:

Mauricio Nunes Macedo de Carvalho – Professor no Bacharelado em Engenharia da Produção (UNIPAMPA); Graduado em Engenharia Elétrica (UFSM), Mestre em Engenharia da Produção (UFSM); Doutor em Engenharia da Produção e Sistemas (UNISINOS); Membro do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), Coordenador do NEABI Oliveira Silveira (UNIPAMPA), Coordenador da Comissão de Avaliação Docente de Estágios Probatórios (UNIPAMPA). Coordenador do Comitê de Apoio Técnico  Equidade (CAT-Equidade UNIPAMPA). Coordenador de Tutoria do Curso de Extensão, Formação para docência e gestão para educação das relações étnico-raciais e quilombolas (UAB-UNIPAMPA). 

Vitória Vasconcellos da Luz  – Egressa do curso Técnico Integrado em Informática no Instituto Federal de Ciência e Tecnologia Sul-Riograndense, do curso de Tecnologia em Análise e Desenvolvimento de Sistemas ambos no IFSul, Câmpus Bagé. Especialista em informática da educação e educação especial pela FACIBA. Mestre em ensino pela Universidade Federal do Pampa. Realiza pesquisas nas áreas de ações afirmativas, inclusão e acessibilidade. É voluntária na Associação Bajeense de Pessoas com Deficiência (ABADEF). Coordenadora Adjunta do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (NEABI – Oliveira Silveira) e do Grupo de Pesquisas INCLUSIVE ambos da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) do Campus Bagé. É técnica administrativa em educação na Unipampa onde atuou na Diretoria de Tecnologia da Informação e Comunicação – DTIC e, atualmente, é Assessora de Tecnologia, Comunicação e Acessibilidade na Pró-Reitoria de Comunidades, Ações Afirmativas, Diversidade e Inclusão – PROCADI.

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