Ano 12 Nº 109/2024 O desenvolvimento das competências socioemocionais como aliado na formação docente

Por: Mariana de Mello Pereira

Fonte: iStock, 2021

Nos últimos quatro anos, especialmente, fomos surpreendidos com calamidades públicas. No Brasil, de fevereiro de 2020 a maio de 2023, a pandemia de COVID-19 foi enfrentada. No Rio Grande do Sul, nos meses de abril e maio de 2024, a maior tragédia climática do Estado foi registrada e seus impactos ainda são sentidos. Em ambos os eventos citados, a instituição escolar e os seres nela envolvidos precisaram, além de rever suas práticas, lidar com questões socioemocionais. Tal processo, feito de maneira emergencial deve, na verdade, ser desenvolvido ao longo da formação dos profissionais da área da educação para que estes estejam mais preparados para lidar não só em situações emergenciais, mas também em situações rotineiras do mundo escolar ou acadêmico.

As questões socioemocionais, no entanto, não precisam ser vistas como algo separado da prática, pois uma deve estar intrínseca a outra. Na verdade, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (Brasil, 2018) determinou em 2018 que todas as escolas deveriam contemplar as competências socioemocionais em seus currículos, uma vez que beneficiaria o aluno para além das competências cognitivas/acadêmicas, mas no desempenho escolar de modo geral e na manutenção de uma sociedade pró-social (CASEL, 2015).

Como sabemos, a BNCC contempla a Educação Básica. Para o Ensino Superior, temos o Conselho Nacional de Educação/Conselho Pleno (CNE/CP) e o Projeto Pedagógico de Curso (PPC). O CNE, na Resolução CNE/CP nº 2, de 20 de dezembro de 2019, define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação) (Brasil, 2019). Já o PPC é específico a cada curso e a cada universidade, mas deve seguir as orientações do CNE.

Devido à importância do desenvolvimento de competências socioemocionais, existem programas educacionais específicos para este intuito, tais como o CASEL (Collaborative for Academic, Social and Emotional Learning), o qual é, inclusive, adotado pela BNCC. De acordo com Frohmut et al. (2021), o referido programa entende que a competência socioemocional refere-se à capacidade de integrar pensamentos, sentimentos e comportamentos de modo a desempenhar tarefas sociais e atingir resultados valorizados pessoalmente e no contexto cultural, quer no aspecto social, quer no emocional. Por isso, a promoção de uma educação socioemocional é fundamental para que o ser humano esteja melhor preparado para lidar com as diversas situações impostas pela vida.

As competências socioemocionais apresentadas pelo programa CASEL são, a autoconsciência, a autorregulação, a consciência social, as habilidades de relacionamento e a tomada de decisão responsável.


– Autoconsciência, também conhecida como autoconhecimento, refere-se a habilidade de compreender as próprias emoções, pensamentos e valores e como eles influenciam o comportamento em diferentes contextos. Isso inclui a capacidade de reconhecer as próprias forças e limitações com um senso fundamentado de confiança e propósito.

– Autogestão, também conhecida como autogerenciamento, autorregulação e autocontrole, refere-se a habilidade de gerenciar eficazmente as próprias emoções, pensamentos e comportamentos em diferentes situações para alcançar metas e aspirações. Isso inclui a capacidade de adiar gratificações, lidar com o estresse e sentir motivação e autonomia para realizar objetivos pessoais e coletivos.

– Consciência Social: As habilidades para entender as perspectivas dos outros e ter empatia, incluindo aqueles de diferentes origens, culturas e contextos. Isso inclui a capacidade de sentir compaixão pelos outros, compreender normas históricas e sociais mais amplas para o comportamento em diferentes contextos e reconhecer os recursos e apoios da família, escola e comunidade.

– Habilidades De Relacionamento: As habilidades para estabelecer e manter relações saudáveis e de apoio, além de navegar de forma eficaz em ambientes com indivíduos e grupos diversos. Isso inclui a capacidade de se comunicar de forma clara, ouvir ativamente, cooperar, trabalhar colaborativamente para resolver problemas e negociar conflitos de forma construtiva, lidar com ambientes com diferentes demandas e oportunidades sociais e culturais, exercer liderança e buscar ou oferecer ajuda quando necessário.

– Tomada De Decisão Responsável: As habilidades para fazer escolhas cuidadosas e construtivas sobre o comportamento pessoal e interações sociais em diversas situações. Isso inclui a capacidade de considerar padrões éticos e preocupações com a segurança, bem como avaliar os benefícios e as consequências de várias ações para o bem-estar pessoal, social e coletivo (CASEL, 2020, tradução nossa).

O papel das competências socioemocionais é indiscutível para quem busca a formação integral do ser humano, a qual vem a prepará-lo não somente com o repertório linguístico e cultural de um idioma, mas também para enfrentar as mais diversas situações do dia a dia, tais como a capacidade de regular as emoções, manejo do estresse e empatia pelo próximo.

Fonte: iStock, 2021

Com base nos mesmos princípios das competências gerais estabelecidas pela BNCC, o artigo terceiro do CNE (Brasil, 2019) destaca que se espera do licenciando o desenvolvimento das correspondentes competências gerais docentes. Na BNC-Formação é possível encontrar um anexo com as competências gerais docentes que devem ser desenvolvidas ao longo da formação dos professores, as quais correspondem às competências gerais que devem ser desenvolvidas nos estudantes da educação básica, ou seja, correspondem a BNCC Básica. 

As competências gerais docentes seguem as 10 competências gerais da BNCC (Brasil, 2018), as quais buscam incorporar a aprendizagem socioemocional no currículo escolar, a saber: (1) conhecimento, (2) pensamento científico, crítico e criativo, (3) repertório cultural, (4) comunicação, (5) cultura digital, (6) trabalho e projeto de vida, (7) argumentação, (8) autoconhecimento e autocuidado, (9) empatia e cooperação e (10) responsabilidade e cidadania. 

Dentre essas competências é possível encontrar similaridades das competências socioemocionais propostas pelo programa CASEL. Segundo Frohmut et al. (2021) as competências socioemocionais do programa CASEL estão de acordo com as dez competências gerais da BNCC, uma vez que uma ou mais habilidades descritas na BNCC estão relacionadas com cada competência socioemocional listada por CASEL. Os autores ainda apontam semelhanças entre algumas competências, como por exemplo, entre a competência socioemocional “Consciência Socioemocional” do programa CASEL e as competências gerais “Empatia e Cooperação” e “Responsabilidade e Cidadania” da BNCC. 

Em “Empatia e Cooperação”, a BNCC destaca a importância de praticar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, garantindo o respeito próprio e ao próximo, promovendo os direitos humanos. Valorizar e acolher a diversidade de indivíduos e grupos sociais, reconhecendo seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem qualquer tipo de preconceito. Já em “Responsabilidade e Cidadania” o agir de forma autônoma e coletiva, com responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação, tomando decisões fundamentadas em princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários é incentivado (Frohmut, 2021). 

Como mencionado anteriormente, o CNE definiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica  (BNC-Formação) (Brasil, 2019). E, portanto, as competências socioemocionais devem ser desenvolvidas com os licenciados também. Contribuindo, assim, para que a educação básica e a superior caminhem lado a lado, pois todos os níveis de ensino ocupam seu espaço de importância na formação dos seres humanos. 

Porém, ainda que essa normativa esteja presente nas diretrizes curriculares do Ensino Básico e Superior, e que em virtude disso apareça nos planos de ensino das escolas, bem como nos PPCs dos cursos de licenciatura, isso não quer dizer que as competências com enfoque socioemocional venham a ser trabalhadas com os alunos ou que assumam um algum tipo de protagonismo no processo de ensino-aprendizagem.

Por isso, é fundamental que assim como as escolas, as universidades também fomentem o desenvolvimento das competências socioemocionais dos professores, para que eles, por sua vez, desenvolvam essas competências com seus alunos. E, para que também, estejam melhor preparados para lidar com as diversas situações impostas pela vida.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018.

BRASIL. Resolução CNE/CP nº 2, de 20 de dezembro de 2019. Brasília, 2019. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/docman/dezembro-2019-pdf/135951-rcp002-19/file. Acesso em: 5 out. 2024.

CASEL. Collaborative for Academic, Social, and Emotional Learning. An educational leader’s guide to evidence-based. Disponível em: https://casel.org/. Acesso em: 1 out. 2024.

FROHMUT, D. F. ; NEMER, . G. ; BERGAMO, O. C. ; RAMIREZ, . A. O desenvolvimento das competências socioemocionais nas aulas de língua inglesa do Ensino Médio e Técnico. Revista CBTecLE, [S. l.], v. 4, n. 1, p. 256–267, 2021. Disponível em: https://revista.cbtecle.com.br/index.php/CBTecLE/article/view/256. Acesso em: 6 maio. 2024.

Mariana de Mello Pereira:
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Ensino de Línguas (PPGEL)

Esse texto é parte do dossiê “Relatos De Experiências E Divulgação Científica Na Formação Continuada De Professores De Línguas Na Pós-Graduação”. Você pode encontrar os outros textos aqui:

https://junipampa.info/educacao/ano-12-no-102-2024-relatos-de-experiencias-e-divulgacao-cientifica-na-formacao-continuada-de-professores-de-linguas-na-pos-graduacao/

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